Estamos envolvidos, desde outubro de 2020, numa oficina de formação com colegas da Escola Básica da Boa Água, na Quinta do Conde – Sesimbra, no âmbito do Projeto piloto da DGE sobre utilização de manuais digitais. Todas as sessões da formação têm decorrido mediadas pelas tecnologias, não sendo possível, devido à pandemia que atravessamos, o contacto físico com os colegas. Assim, ao longo das sessões de formação, fomos conhecendo e tomando contacto com as práticas de uma turma de professores, no âmbito da formação e não só. Além de terem divulgado as suas práticas, na comunidade de aprendizagens de professores do primeiro ciclo do ensino básico, estiveram também presentes num dos nossos webinares, partilhando o que faziam. Este contacto virtual, destes meses, fez crescer em nós o desejo de os conhecer pessoalmente e de visitar a escola. No dia 2 de junho pudemos, finalmente, fazer a tão aguardada visita e ouvir e exclamar “afinal são mais altos do que parecem no Zoom”, “Se não ouvisse a tua voz não te reconhecia” e outras expressões que apenas o presencial possibilita.
Como combinado, chegamos à escola às 10 da manhã e a nós, os três formadores das duas turmas de formação, juntaram-se dois membros do Centro de Formação que, em articulação com a Direção Geral de Educação, a promove. Receberam-nos dois colegas formandos, que nos cumprimentaram mas foram logo dizendo que a visita não seria acompanhada por eles mas sim por quatro simpáticas alunas dos 5.ºs e 6.ºs anos que nos mostrariam a escola e responderiam às nossas questões. Quanto a eles, voltaram para as suas atividades, onde os encontramos mais tarde.
Assim, fomos acompanhados na nossa visita pela Adriana, pela Margarida e pela Inês, de 12, 11 e 12 anos, respetivamente, que frequentam o 6.º ano e ainda pela Daniela, de 11 anos, que frequenta o 5.º ano. Prepararam para nós um roteiro, que todas traziam na mão, de modo a passarmos por todos os locais que consideraram importantes mostrar, da sua escola. Ao longo de duas horas, foram seguindo o plano traçado, mostrando a escola a 5 adultos a quem ainda se juntou o Sr. Diretor do Agrupamento.
Não é de estranhar que a equipa que nos mostrou a escola incluísse alunos de dois anos de escolaridade diferentes. Sabíamos já, pelos relatos dos professores na formação, que o trabalho conjunto entre alunos de anos diferentes é contínuo e permanente nesta escola. Viríamos também a constatar isso mesmo, cada vez que entramos numa das muitas salas de aula, onde alunos do 5.º e do 6.º ou do 7.º e 8.º trabalhavam em grupo, à volta de uma ilha formada pela junção de 2 ou 3 mesas que, frequentemente, estava equipada com um computador.
Pelos corredores da escola, vimos os trabalhos desenvolvidos pelos alunos, onde destacamos o sistema solar representado à escala. Na verdade, como nos explicaram, os alunos utilizaram duas escalas neste trabalho, usando uma para representar os planetas, guardando as proporções entre si, e outra para as distância entre eles.
Mas o trabalho dos alunos era também visível no exterior onde, por exemplo, nasce uma estrutura em espiral para construção de uma horta pedagógica. Todo o trabalho de planeamento, explicaram as nossas guias, está a cargo dos alunos com a sua professora de matemática que desenharam a estrutura, primeiro no papel e depois no solo onde ficaria implementada, mas também calcularam todos os materiais necessários à construção e gastos envolvidos. Neste momento, calculam o volume de terra fértil que será necessário adquirir para encher a estrutura que se encontra praticamente pronta.
Na viagem que fizemos pela escola encontramos vários dos colegas que trabalham connosco na formação e nos foram convidando a entrar na sua sala ou a acompanhar atividades que funcionavam fora dela. Confessamos que não foi fácil reconhecê-los de imediato, mas a voz e o olhar ajudaram! Pelas salas, fomos encontrando alunos envolvidos em Jogos de Fuga que, como nos explicaram as nossas guias, os professores tinham experimentado usar quando se encontravam a distância e que os alunos adoraram. Por isso, continua a ser uma estratégia de ensino, agora, presencial. Outros alunos encontravam-se envolvidos em Webquests ou a manusear papéis e tesouras para criarem materiais inspirados em rosáceas, que desenharam em computador, ou em desenhos do Escher.
Numa das salas, os alunos consultavam materiais das plataformas online das editoras, em regime autónomo, seguindo guiões que o professor lhes fornecera e, de tão empenhados na tarefa, pareciam não reparar na nossa presença, continuando a trabalhar enquanto o professor conversava connosco sobre o que faziam. Quando chegamos a essa sala, um dos grupos assistia a um vídeo sobre o sistema respiratório de mamíferos, passando depois à consulta de material sobre o mesmo tema.
Noutra das salas, os alunos trabalhavam, em grupo, sobre a preparação de uma viagem a Guimarães para visitar o seu castelo.
A maioria das salas que visitamos estava preparada para trabalho de grupo e cada um dos grupos tinha à disposição um computador para usar, se necessário. Os grupos, como nos disseram, eram constituídos por alunos de mais do que um ano de escolaridade que trabalhavam colaborativamente.
Uma das salas, no entanto, inspirada no modelo de “salas de aula do futuro”, estava pintada de cores fortes formando áreas com funções específicas que as nossas guias nos explicaram. Além das cores com que estava pintada, o mobiliário e material tecnológico transportava-nos para um ambiente diferente. No entanto, foi o modelo pedagógico seguido na hora da visita que mais nos cativou. Decorria uma tertúlia literária e uma das alunas preparava-se para partilhar com os presentes um livro que tinha lido. Questionada pela professora se poderia fazer a apresentação connosco a assistir, a aluna aceitou o desafio. No final da excelente apresentação, os colegas questionaram-na e apreciaram o trabalho desenvolvido. À medida que a sessão decorria, a professora pedia aos alunos que assumissem uma determinada configuração. A transformação acontecia de forma ordeira, em poucos segundos, permitindo-lhes, facilmente, voltar-se para a colega que apresentava ou formar um círculo para discutirem entre si. O entusiasmo em torno desta sala, mas sobretudo sobre o que nela decorria, foi tanto que, embora avisados pelas nossas anfitriãs, acabamos por não ter tempo de espreitar outra das atividades previstas e, por isso, deixamos aqui, a elas e ao professor que nos esperava, as nossas desculpas.
Pouco antes de terminarmos a visita, tivemos ainda tempo de passar pela sala de música onde os alunos ensaiavam, graças a umas máscaras inovadoras que, segundo nos disse a sua professora, foram construídas com base nas que estão a ser usadas nas orquestras para continuarem a ensaiar em tempo de pandemia.
Acabamos a visita na sala de professores à volta de um simpático lanche que a escola nos ofereceu.
Foi para nós um verdadeiro prazer ir conhecer pessoalmente os colegas que têm partilhado, ao longo do ano, algumas horas connosco refletindo sobre metodologias ativas e formas de usar as tecnologias digitais no processo de ensino e aprendizagem. Encontramos uma escola inovadora a muitos níveis. A tecnologia está presente mas não será, na nossa opinião, o único fator de sucesso deste projeto inovador. Não encontramos nenhum laboratório repleto de computadores onde os alunos individualmente aprendessem a usá-los, mas antes computadores espalhados pela escola que os alunos usavam, principalmente em grupo, quando necessitavam. O digital convive com o analógico, ocupando um lugar importante no acesso à informação, mas as questões metodológicas estão no centro de muitas das atividades a que assistimos.
Encontramos uma escola onde nos pareceu que os professores e alunos se sentem felizes trabalhando, sobretudo, em torno de projetos de pequena ou grande dimensão. A indisciplina parece não existir e cada aluno parece saber exatamente o que fazer em cada momento.
Queremos deixar um agradecimento à Direção por nos acolher, na pessoa do Sr. Diretor Nuno Mantas, mas também aos colegas da formação que prepararam a visita e sobretudo às quatro alunas que nos acompanharam. Temos a certeza que voltaremos e que, se possível, traremos colegas connosco porque tem sido um prazer imenso trabalhar, ao longo deste ano, com este grupo de professores especiais que também eles trabalham numa escola especial que merece uma visita de qualquer professor.
João Torres e João Grácio